(Até a data, ainda só andava à volta de si própria e para trás)
No domingo à tarde, já andava pela sala toda para vir à minha procura noutra divisão.
Conforme "andava" dava gargalhadas e gritinhos de felicidade.
Ontem foi à creche.
Ao final do dia: já foi à box da TV, já se meteu debaixo de uma cadeira deixando a cabeça lá presa, e por um segundo não mandou o candeeiro da sala ao chão.
Portanto, deu-se o fim do meu (ainda que pouco) sossego.
Casei na véspera do dia em que fiz 30 anos. Com a minha alma gémea. O amor da minha vida.
Mudei de emprego, para uma situação que me trouxesse mais estabilidade.
Não gostei. Detestei.
Voltei à atividade anterior.
Aos 31.
Engravidei.
Aos 32.
Nasceu a Maria.
E descobri o AMOR maior do mundo. Descobri outra pessoa em mim. O Eu Mãe. E percebi o que é o amor incondicional. Basta olhar para os olhos dela para ver que há ali sempre amor. E faço, desde então, tudo, para não desiludir aquele olhar.
Os anos que se seguiram não foram fáceis. Foram tempos difíceis. E vividos de forma muito fechada por nós. Marcas que ficam para sempre.
Mas a Maria cresceu sempre feliz. Uma miúda incrível. Cheia de perguntas e coisas para dizer.
Aos 36.
Surge uma nova oportunidade profissional. Aquela que eu desejava desde o dia em que terminei o meu curso superior.
Começámos a recuperar.
Mudámos para o campo. Para uma aldeia pequenina.
Comecei a correr.
Aos 37.
O meu pai faleceu. Suicidou-se. O fim de uma vida difícil, amargurada, que deixou marcas em todos. Ainda hoje não sei lidar com este assunto.
Corri a minha primeira meia maratona e mais duas provas longas: 20 km e 15 km.
Aos 38.
Corri a minha segunda meia maratona. Uma prova com um desgaste físico brutal, com a qual eu me tinha comprometido e decidido levar até ao fim. Acabei a chorar, com uma sensação de superação incrível. Uma descarga fortíssima de tudo o que tinha vivido nos últimos anos.
Engravidei.
Nasceu a Marta.
E eu percebo que "este" amor não é infinito.
A Maria tornou-se irmã.
Aos 39.
Mãe de duas.
Sem dúvida, "uma outra mãe". Mais calma. Mais experiente. Mais consciente de mim própria.
Surgiu a pandemia do COVID-19. Fiquei fechada em casa com as miúdas 3 meses e meio. Toda uma nova realidade. Teletrabalho. Telescola. Bebé a crescer e a ficar mais atenta a tudo. Dei por mim muitas vezes a fingir que ia estender a roupa, só para estar no quintal um bocadinho sozinha.
A Marta fez 1 ano.
A Maria está com 7 anos.
Continuo com o amor da minha vida ao meu lado.
Só com ele ao meu lado poderia ter aguentado tudo isto.
Chego aos 40 a amar. A ser amada. Com um marido incrível. Duas filhas que riem com o corpo todo. Com uma mãe forte e lutadora. Um irmão e uma irmã que sabem lidar comigo como mais ninguém, e que estão sempre presentes em mim. Amigos com os quais eu sei que posso contar.
E acima de tudo, bem comigo própria, mas com um longo caminho de "coisas minhas" ainda a percorrer.
"Dentro de nós há um espesso sistema de corredores e de portas fechadas. Nós próprios não abrimos todas as portas, porque suspeitamos que o que há do outro lado não será agradável de ver. Vivemos numa espécie de alarme em relação a nós mesmos".
Gatos nas minhas pernas. Cortar fruta para sumo. Moer café. Músicas infantis como fundo. Cães no quintal a ladrar. Hábitos da minha manhã, que já se tornaram rotinas. Podia ser em silêncio? Podia. Mas não seria certamente a mesma coisa.
Uma das principais aprendizagens durante o meu longo confinamento, foi de que preciso de pouca gente e pouca coisa para me sentir bem comigo própria.
No fundo já o sabia. Mas mais por pressão de outros, dei por mim muitas vezes a fazer coisas que não me apetecia, ou a estar com pessoas só porque sim.
Tivemos (todos nós, na generalidade) que passar ao básico. Eliminámos hábitos, relações, porque não eram essenciais. Tivemos que ficar connosco e com os nossos.
É certo que me fizeram falta alguns. E o desconfinamento vai resolvendo isso.
No entanto, na pressa de vida, julgo que muitos, e apesar de terem feito também este exercício, voltaram as relações tóxicas e aos hábitos menos bons.
Eu prefiro seguir esta tendência: ficar com os meus, procurar quem me fez falta, e viver dentro "das minhas coisinhas".
E assim vamos regressando, a esta "nova normalidade".
Resumo dos dias:
A escola da Maria não foi fácil. Muito desgastante. No entanto, melhor do que eu imaginava. Os trabalhos solicitados pela professora tinham a dose certa. No entanto, tive que desistir do #estudoemcasa. O nível de concentração dela era zero. E eu senti que só estava a perder tempo. Alguma dificuldade minha em explicar algumas coisas. Dias de pura resistência da parte dela. Outros dias, tudo fluía. Houve manhãs naquela casa de muitos gritos, choro, falta de paciência. Outros em que ela despachava tudo num instante, sem qualquer stress. Já passou. Vamos ver como vai ser no próximo ano lectivo. Para já foi de férias para casa dos avós. Esteve sempre comigo, resguardada, por isso foi de boa saúde. Preferi isso a colocá-la no ATL, uma vez que estamos ainda perante este cenário de "guerra".
A Marta ainda é bebé. As indicações da creche pareceram-me seguras e simples de implementar. Chorou nos 2 primeiros dias. Depois passou. Começou a ir na segunda quinzena de junho. Já noto diferenças. Quando a vou buscar até fica zangada comigo. Já fomos passear à praia. Chorou assim que a sentei na areia e mexeu com as mãos.
A nossa vida social continua inexistente e assim continuará não sei até quando. Sinto-me mais segura assim.